19
mar
2025

Sigilo bancário em risco no Brasil?

O sigilo bancário é um direito fundamental garantido pela Constituição Brasileira, essencial para manter a confiança entre cidadãos e instituições financeiras. No entanto, esse direito tem sido colocado em questão nos últimos anos devido ao avanço da tecnologia, mudanças legislativas e o aumento das políticas públicas de combate à corrupção e aos crimes financeiros. Embora o sigilo bancário seja protegido pela Constituição, existem exceções previstas pela lei, como a possibilidade de sua quebra em investigações judiciais ou mediante autorização legal.

Nos últimos tempos, a crescente digitalização dos serviços bancários e o uso de novas tecnologias trouxeram tanto benefícios quanto desafios, especialmente no que se refere à segurança dos dados. Com o aumento do uso de plataformas digitais, também aumentaram os riscos de ataques cibernéticos e crimes virtuais, o que coloca em questão a integridade e a privacidade das informações bancárias.

Além disso, o fortalecimento das políticas de transparência fiscal e o combate a crimes financeiros têm gerado discussões sobre a ampliação da fiscalização das transações bancárias, o que pode resultar na violação do sigilo bancário, principalmente quando não se segue o devido processo legal.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma decisão relevante ao autorizar que instituições financeiras compartilhem dados de seus clientes diretamente com órgãos de fiscalização, como a Receita Federal e o Banco Central, sem a necessidade de uma ordem judicial prévia. Essa decisão, embora tenha como objetivo fortalecer o combate à corrupção e a crimes como a lavagem de dinheiro, gerou controvérsias, especialmente no que diz respeito à proteção da privacidade dos cidadãos e ao respeito ao sigilo bancário. A permissão para esse compartilhamento de dados sem a supervisão judicial direta pode ser vista como uma flexibilização do sigilo bancário, o que levanta preocupações sobre o impacto que isso pode ter na segurança das informações pessoais. 1

O compartilhamento de dados sem supervisão judicial direta pode ser visto como uma flexibilização do sigilo bancário, o que levanta preocupações sobre os impactos na segurança das informações pessoais.

O assunto também está em discussão no Supremo Tribunal de Justiça (STJ), pois, embora o STF tenha decidido pela constitucionalidade da requisição direta de informações pela Administração Tributária às instituições financeiras no âmbito do processo administrativo fiscal, o STJ se posicionou recentemente de maneira distinta. Neste sentido, o Supremo Tribunal de Justiça consolidou a vedação da quebra de sigilo bancário sem autorização judicial para apuração de responsabilidade criminal em processos penais, afirmando que provas obtidas dessa maneira não podem ser utilizadas para fundamentar o processo penal.

Esse entendimento foi consolidado em liminar concedida pelo ministro Sebastião Reis Júnior, da 6ª Turma Criminal do STJ, que suspendeu um processo em que as provas foram obtidas pelo Fisco sem ordem judicial, e estariam sendo utilizadas para embasar uma ação penal. A decisão, portanto, destaca que não se admite que dados sigilosos obtidos pela Receita Federal sejam repassados ao Ministério Público ou à polícia para uso em ação penal sem a devida autorização judicial. 2

Além disso, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que entrou em vigor em 2020, trouxe um novo marco para a proteção da privacidade e dos dados pessoais no Brasil. A LGPD exige maior transparência no uso de dados, incluindo os bancários, o que cria um cenário de incertezas jurídicas, uma vez que o acesso a dados bancários por autoridades pode entrar em conflito com a proteção estabelecida pela lei.

Portanto, tem-se que o sigilo bancário no Brasil enfrenta uma série de desafios, especialmente com a necessidade de garantir a transparência das transações financeiras e combater crimes como a lavagem de dinheiro, que acaba por conflitar com o direito à privacidade dos cidadãos, o que exige um equilíbrio entre a segurança pública e sua proteção e a proteção dos direitos individuais.

Assim, a conscientização sobre o uso responsável dos dados bancários também desempenha um papel importante. Cidadãos bem-informados sobre seus direitos podem exigir maior transparência e controle sobre as práticas das instituições financeiras, garantindo que suas informações sejam tratadas de forma segura.

Em um contexto em que a vigilância das transações financeiras é facilitada, é essencial que o Brasil preserve a privacidade de seus cidadãos sem comprometer a eficácia das investigações e a segurança pública. O futuro do sigilo bancário no Brasil, portanto, dependerá da capacidade do país em criar um ambiente jurídico que proteja os direitos individuais sem prejudicar a segurança e a transparência necessárias para o combate à criminalidade financeira.

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Disponível em https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/09/10/stf-nao-decretou-o-fim-do-sigilo-bancario-no-brasil-entenda-o-que-aconteceu.ghtml. Acesso em: 17.03.2025.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-fev-28/ministro-suspende-acao-quebra-sigilo-bancario-receita/. Acesso em: 17.03.2025.