15
abr
2024

Parâmetros para imputação de dolo eventual aos agentes de crimes cometidos no trânsito – Parte 1

Da culpa, seus elementos essenciais e modalidades.

Por João Vitor Moreira Michelin

O exercício do contraditório jurídico frequentemente nos coloca diante de casos desafiadores, nos quais distinguir entre culpa consciente e dolo eventual se torna uma tarefa complexa. Afinal, estamos lidando com uma questão intrinsecamente ligada ao estado mental do autor, muitas vezes inacessível para os demais envolvidos no processo.

Diante desses cenários onde os limites entre culpa consciente e dolo eventual se tornam difusos, é necessário uma compreensão profunda das normas legais e das tendências jurisprudenciais para efetuar tal distinção.

Hoje iniciaremos a nossa série sobre parâmetros para imputação de dolo eventual aos agentes de crimes cometidos no trânsito, e de início iremos compreender o que é a Culpa no Direito Penal Brasileiro.

O Código Penal, ou seja, o Decreto Lei 2.848, promulgado em 1940, enquadra os crimes nele previstos em dois tipos essenciais, quais sejam, o doloso e o culposo:

Art. 18 – Diz-se o crime:

I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;

II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Ou seja, o crime caracteriza-se culposo “quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia”. Disto se extrai que há um dever objetivo de cuidado que deve ser observado por todos os presentes em território brasileiro, sob pena de sanção penal.

Eis os elementos essenciais da culpa, ou seja, sem os quais ela não pode ser caracterizada:

a) A conduta, com vistas à forma imprópria com que atua o agente para alcançar um determinado fim, causando resultado adverso do pretendido.

b) O dever de cuidado objetivo, consistente nas cautelas necessárias para que suas ações não incorram em danos a bens jurídicos alheios.

Por vezes, está regularizada expressamente na legislação, sob a necessidade de dirigir com CNH, por exemplo. No entanto, há outras situações em que o dever de observância é mensurado em juízo, com vistas à situação fática em tratamento.

c) O resultado lesivo involuntário, que pode influir num bem jurídico comum ou individual, concreto ou abstrato. Basta que esteja previsto em lei que a lesividade a este bem jurídico pode caracterizar um crime e, portanto, a apuração legal é possível.

d) A previsibilidade: Segundo Mirabete (2009) trata-se da possibilidade do conhecimento de que o resultado lesivo pode ocorrer. Ou seja, a possibilidade de se antever o resultado, nas condições em que se encontrava o sujeito no momento do delito e em ato preparatórios. Se o resultado for previsto, sobrevirá a culpa consciente, enquanto, sem a previsão, caracteriza-se a culpa inconsciente.

e) Tipicidade: Nos crimes culposos, consiste na adequação do artigo 18, II à conduta punível. Desta feita, é típica a ação que provocou o resultado quando não observado o dever de cuidado objetivo.

Por conseguinte, quanto às modalidades da culpa (negligência, imprudência e imperícia), trata-se das formas de manifestação da referida falta de cuidado objetivo, que iremos falar na próxima semana.